Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 35 nº 1 - Jan. / Fev.  of 2002

RELATO DE CASO
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Page(s) 51 to 54



SARCOMA SINOVIAL FIBROSO DO PÉ: RELATO DE CASO

Autho(rs): Ana Cláudia Ferreira Rosa, Márcio Martins Machado, Luiz Eduardo Grasso Filho, Flávio Albertotti, Edson Sato, Marco Antônio Junqueira Figueiredo, Cézar José Albertotti, Giovanni Guido Cerri

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Texto em Português English Text

Descritores: Sarcomas sinoviais, Tumores de partes moles, Ultra-sonografia, Ressonância magnética

Keywords: Synovial sarcomas, Soft-tissue tumors, Ultra-sonography, Magnetic resonance imaging

Resumo:
Os autores relatam o caso de uma paciente de 24 anos de idade, que apresentou dor e aumento do volume do hálux esquerdo há três meses. A ultra-sonografia mostrou massa sólida, hipoecóide, heterogênea, com áreas císticas e calcificação, no dorso do hálux esquerdo, em partes moles, com estrutura tendínea no seu interior, sem aparente comprometimento de estruturas ósseas. O estudo com Doppler colorido mostrou hipervascularização central e periférica na lesão. A ressonância magnética evidenciou massa sólida, de partes moles, com estrutura tendínea no seu interior, com médio sinal em T1 e alto sinal em T2, com realce intenso e heterogêneo pelo meio de contraste paramagnético, sem acometimento de estruturas ósseas. A paciente foi submetida a procedimento cirúrgico, com ressecção da lesão descrita, no dorso do hálux esquerdo, e o exame anatomopatológico demonstrou tratar-se de sarcoma sinovial fibroso monofásico.

Abstract:
The authors report a case of a 24 year-old female patient with a three-month history of pain and enlargement of the left halux. Ultrasound showed a heterogeneous, hypoechoic solid soft tissue mass with cystic areas and calcification in the dorsum of the left halux. A tendinous structure was identified within the lesion but no evidence of involvement of adjacent osseous structures was found. Doppler ultrasound revealed central and peripheral hypervascularization of the lesion. Magnetic resonance imaging demonstrated a solid soft tissue mass containing a tendinous structure. The lesion appeared as an intermediate signal intensity structure on T1 images, high signal intensity on T2 images, and showed marked enhancement after intravenous administration of gadolinium. No osseous lesions were identified. The patient was submitted to surgical resection of the lesion in the dorsum of the left halux and the pathology results revealed a monophasic fibrous synovial sarcoma.

 

 

INTRODUÇÃO

Os sarcomas sinoviais representam neoplasias malignas incomuns, de crescimento lento(1), com relação estreita com tendões, bainhas tendíneas, estruturas bursais e, em menor freqüência, com fáscias, ligamentos, aponeuroses e membranas interósseas(1). Compreendem de 5% a 10% dos sarcomas de tecidos moles, em grandes séries analisadas(2,3).

Esses tumores têm origem de células multipotenciais mesenquimais, com maior incidência em jovens, com idade média variando de 15 a 35 anos, observando-se ligeiro predomínio no sexo masculino(1,4-6).

Localizam-se, comumente, nas proximidades das articulações, sobretudo nos membros inferiores, em posição extra-articular(4). Menos de 10% são intra-articulares(4). Calcificações irregulares ocorrem em 15% desses tumores(1,4).

Os sarcomas sinoviais são geralmente de tamanho significativo ao diagnóstico(7), com propensão a metastatizar para linfonodos(4) e pulmões(1). A recorrência local após exérese é comum, estando associada a pior prognóstico(1).

 

RELATO DO CASO

Paciente do sexo feminino, 24 anos de idade, com história clínica de dor e aumento de volume no pé esquerdo há três meses, apresentando piora acentuada recente, dificultando a deambulação. Negava traumatismos, referindo tratamento apenas com analgésicos. O exame físico revelou limitação da mobilidade do hálux esquerdo, no qual se observou aumento importante do volume, de aspecto irregular, com consistência elástica. Evidenciou-se edema e eritema importante de partes moles adjacentes, com aumento da temperatura no local da lesão. A paciente foi encaminhada à cirurgia, para ressecção tumoral.

A ultra-sonografia mostrou massa sólida, hipoecóide, heterogênea, com áreas císticas e calcificação, no dorso do hálux esquerdo, em partes moles, com estrutura tendínea no seu interior, sem aparente comprometimento de estruturas ósseas (Figuras 1 e 2). O estudo com Doppler colorido mostrou hipervascularização central e periférica na lesão. A ressonância magnética evidenciou massa sólida, de partes moles, com estrutura tendínea no seu interior, com médio sinal em T1 (Figura 3) e alto sinal em T2 (Figura 4), com realce intenso e heterogêneo pelo meio de contraste paramagnético, sem acometimento de estruturas ósseas (Figura 5).

 


 


 


 


 


 

O exame macroscópico do espécime cirúrgico demonstrou formação grosseiramente nodular, medindo 7 × 5 × 4 cm, com superfície externa de aspecto lobulado, amarelado. Aos cortes, identificou-se segmento de tendão no seu interior, com tecido a este nível, de consistência elástica, com áreas friáveis, vinhosas.

O diagnóstico histopatológico foi de sarcoma sinovial monofásico, fibroso, com mínima atividade mitótica e presença de basófilos e células claras.

 

DISCUSSÃO

Os sarcomas sinoviais representam neoplasias malignas incomuns, de crescimento lento(1), com relação estreita com tendões, bainhas tendíneas, estruturas bursais e, em menor freqüência, com fáscias, ligamentos, aponeuroses e membranas interósseas(1). Compreendem de 5% a 10% dos sarcomas de tecidos moles, em grandes séries analisadas(2).

Esses tumores têm origem de células multipotenciais mesenquimais, com maior incidência em jovens, com idade média variando de 15 a 35 anos, com ligeiro predomínio no sexo masculino(1,4-6). Localizam-se, comumente, próximos às articulações, sobretudo nos membros inferiores, em posição extra-articular(4). Menos de 10% são intra-articulares(4). Calcificações irregulares ocorrem em 15% desses tumores(1,4).

Os sarcomas sinoviais são, geralmente, de tamanho significativo ao diagnóstico, apresentando-se como massas tumorais palpáveis e sensíveis(7).

Macroscopicamente, o tumor em seus estádios iniciais é bem circunscrito, aparentemente encapsulado, geralmente com 1¾3 cm. Posteriormente, infiltra difusamente as estruturas adjacentes, especialmente tendões e estruturas nervosas, podendo comprometer o osso e o espaço articular(3).

Histologicamente, dois tipos fundamentais têm sido identificados pela maioria dos autores, sendo um tipo bifásico e um tipo monofásico, este último de mais difícil diagnóstico(3).

O tipo bifásico é mais típico e geralmente não apresenta problemas diagnósticos. É composto basicamente de dois tipos celulares: epiteliais e fusiformes. As estruturas epitelióides usualmente formam cordões sólidos, com espaços irregulares circundados por células cilíndricas, cubóides ou poliédricas, originando aspecto glandular. Estas formações epitelióides podem ser escassas ou numerosas, estando separadas por células fusiformes de aspecto fibroblástico, ricas em fibras de reticulina. A coloração pela prata é útil na visualização das áreas epitelióides que não contêm fibras de reticulina, em contraste com as áreas fusiformes(3).

No tipo monofásico as formações epiteliódes podem ser raras ou ausentes. Os tumores monofásicos predominantemente epitelióides são mais raros que os que possuem predominantemente células fusiformes (fibromas). Existem relatos que citam o tipo monofásico epitelial como carcinoma de partes moles ou carcinossarcoma(3).

A imuno-histoquímica veio auxiliar no diagnóstico desses tumores, que anteriormente eram diagnosticados de maneira errônea como carcinoma metastático, carcinoma de glândulas da pele, melanomas malignos, sarcoma epitelióide e até mesmo como schwannomas malignos(3).

O comportamento biológico dos sarcomas sinoviais é variável, e alguns autores sustentam que as lesões bifásicas têm evolução mais favorável(3). A taxa de sobrevida em cinco anos varia de 25%(2) a 51%(8), independentemente do tipo histológico.

Enzinger(9) encontrou uma evidente diferença na taxa de sobrevida do tipo monofásico pobremente diferenciado (26%), em relação ao tipo bifásico (59%). Outros fatores que alteram o prognóstico correspondem à atividade proliferativa, vascularização e necrose tumoral e à presença de calcificações ou ossificações(3). O prognóstico também varia de acordo com a idade do paciente, tamanho do tumor, sendo melhor em tumores menores que 5 cm(3).

As metástases são mais freqüentes para os pulmões (80%)(1) e para os linfonodos (20%)(4), ocorrendo menos comumente para os ossos e para o cérebro(3).

Devido à relativa baixa incidência do sarcoma sinovial e às diversas formas de tratamento nos diferentes centros, é difícil avaliar a efetividade dos procedimentos terapêuticos empregados(3).

As pequenas lesões (menores que 3 cm), que geralmente têm melhor prognóstico, usualmente são tratadas com sucesso por meio da excisão radical (corte além da lesão). Em geral, o risco de recidiva local é alto, entretanto, os resultados obtidos com a amputação não foram mais favoráveis com relação à incidência de metástases. Na vigência de linfonodomegalias, estas devem ser retiradas. A radioterapia em geral não controla a neoplasia, na maioria dos casos(3).

A associação do tratamento cirúrgico seguido de radioterapia parece promissora. A adição de poliquimioterapia adjuvante e imunoterapia também pode contribuir bastante no manejo terapêutico. Alguns grupos têm preconizado radioterapia e quimioterapia no tratamento pré-operatório(3).

Nos casos de grandes tumores, com invasão de estruturas adjacentes, sobretudo dos ossos, o tratamento usualmente adotado é a amputação, seguida invariavelmente de quimioterapia. A recorrência local após exérese é comum, estando associada a pior prognóstico(1).

O diagnóstico diferencial comumente é feito com sarcoma epitelióide, sarcoma de células claras, melanoma, schwannoma maligno, e no tipo monofásico, com o fibrossarcoma(3).

No que se refere aos métodos de diagnóstico por imagem, temos que a radiografia simples mostra, em geral, massa com densidade de partes moles, lobulada, com margens lisas ou indistintas, podendo apresentar calcificação, com erosão ou invasão óssea em 5% a 20% dos casos(1).

Os estudos com angiografia revelam neovascularização, sobretudo no tumor monofásico, observando-se fina rede de capilares(1).

A ultra-sonografia evidencia massas lobuladas, hipoecóicas, circunscritas, podendo conter áreas de necrose; quando presentes, as calcificações são vistas como focos ecogênicos, com sombra acústica posterior (Figuras 1 e 2)(7). A ultra-sonografia com Doppler é útil, por indicar um aumento da vascularização, com fluxo de distribuição irregular no interior da lesão. A análise espectral mostra fluxo de baixa resistência(7).

Os estudos com tomografia computadorizada possibilitam avaliar a massa com densidade de partes moles, calcificações associadas e a ocorrência de infiltração de estruturas adjacentes(1). A ressonância magnética permite estadiar o envolvimento intra e extra-articular dos sarcomas sinoviais(4,10,11). São realizadas seqüências ponderadas em T1 e T2, com ou sem supressão da gordura. Na seqüência ponderada em T1, a lesão apresenta sinal baixo para intermediário (Figura 3); em T2, com ou sem supressão de gordura, observa-se sinal alto, menor que o de líquido, e áreas de necrose central possuem alto sinal (Figura 4)(4,10). Após a injeção do meio de contraste paramagnético, ocorre realce intenso e heterogêneo, observado na seqüência ponderada em T1 (Figura 5)(4,10).

Em geral, o achado característico à ressonância magnética é de massa multilocular, heterogênea, com septações internas. Calcificações focais são mais bem detectadas pela tomografia computadorizada(4).

 

CONCLUSÃO

Os sarcomas sinoviais representam neoplasias malignas incomuns, de crescimento lento, que têm origem de células multipotenciais mesenquimais e cujo tratamento consiste, habitualmente, na ressecção cirúrgica, podendo esta estar associada à radioterapia, à quimioterapia e mesmo à imunoterapia.

Os métodos de diagnóstico são importantes, na medida em que determinam o tamanho das lesões e suas relações com estruturas adjacentes e o padrão de vascularização, sendo que o exame anatomopatológico é que determina a natureza histológica da lesão.

 

REFERÊNCIAS

1. Madewell JE, Sweet DE. Tumors and tumor-like lesions in or about joints. In: Resnick D, ed. Bone and joint imaging. Philadelphia: Saunders, 1996: 1064¾75.         [  ]

2. Cadman NL, Soule EH, Kelly PJ. Synovial sarcoma. An analysis of 134 tumors. Cancer 1965; 18:613¾27.         [  ]

3. Schajowicz F. Tumores y lesiones seudotumorales de la membrana sinovial. In: Schajowicz F, ed. Tumores y lesiones seudotumorales de huesos y articulaciones. Buenos Aires: Panamericana, 1989:521¾68.         [  ]

4. Stoller DW, Johnston JO, Steinkirchner TM. Bone and soft-tissue tumors. In: Stoller DW, ed. Magnetic resonance imaging in orthopaedics & sports medicine. Philadelphia: Lippincott-Raven, 1997: 1231¾339.         [  ]

5. Braaks J. Disorders of soft tissue. In: Sternberg S, ed. Diagnostic surgical pathology. Vol 1. New York: Raven Press, 1989:161¾4.         [  ]

6. Tsumyoshi M. Synovial sarcoma: a clinicopathologic and ultrastructural study of 42 cases. Acta Pathol 1983;33:23¾7.         [  ]

7. Fornage BD. Massas nas partes moles. In: Fornage BD, ed. Ultra-sonografia do sistema musculoesquelético. Rio de Janeiro: Revinter, 1999: 19¾39.         [  ]

8. Mackenzie DH. Synovial sarcoma. A review of 58 cases. Cancer 1966;19:169¾80.         [  ]

9. Enzinger FM. Clasificación y diagnostico de los sarcomas de partes blandas. Acta Orthop Lat Am 1974;1:103¾15.         [  ]

10. Vanel D, Shapeero LG, De Baere T, et al. MR imaging in the follow-up of malignant and aggressive soft-tissue tumors: results of 511 examinations. Radiology 1994;190:263¾8.         [  ]

11. Tillotson JF, McDonald JR, Janes JM. Synovial sarcomata. J Bone Joint Surg 1951;33:459¾63.         [  ]

 

 

* Trabalho realizado no Centro de Diagnóstico do Hospital Sírio Libanês, São Paulo, SP.
1. Médica Assistente do Departamento de Radiologia do Hospital Sírio Libanês, Pós-graduanda do Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
2. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia, Pós-graduando do Departamento de Radiologia da FMUSP.
3. Médicos Residentes de Radiologia do Hospital Sírio Libanês.
4. Chefes dos Serviços de Tomografia Computadorizada e de Ressonância Magnética do Hospital Sírio Libanês.
5. Chefe do Centro de Diagnóstico do Hospital Sírio Libanês, Professor Titular do Departamento de Radiologia da FMUSP, Diretor do Instituto de Radiologia (InRad) e da Divisão de Diagnóstico por Imagem do Instituto do Coração (InCor) doHospital das Clínicas da FMUSP.
Endereço para correspondência: Prof. Dr. Giovanni Guido Cerri. Instituto de Radiologia, HC-FMUSP. Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 255, 3o andar. São Paulo, SP, 05403-001. E-mail:giovanni.cerri@hcnet.usp.br
Recebido para publicação em 18/5/2001. Aceito, após revisão, em 10/9/2001.

 
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