Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 48 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2015

CARTA AO EDITOR
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Page(s) 127 to 128



Cólon biliar: um caso incomum de obstrução intestinal

Autho(rs): Ernesto Lima Araujo Melo1; Francisco Thiago Martins de Paula1; Rainne André Siqueira1; Sariane Coelho Ribeiro2

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Sr. Editor,

Paciente mulher, 80 anos, diabética, hipertensa e obesa, referiu início súbito de intensa dor em cólica no hipogástrio por dois dias. Adicionalmente, acompanhou-se quadro de náuseas, parada da eliminação de gases e fezes, além de distensão abdominal. Ao exame físico constataram-se aumento do volume abdominal, dor à palpação profunda do hipogástrio, timpanismo abdominal à percussão e sinais de leve desidratação. A hipótese clínica levantada foi síndrome obstrutiva.

Foram realizadas, em outro serviço, radiografias e ultrassonografia abdominal, porém inconclusivas quanto à causa. Radiografias abdominais anteroposteriores em ortostase e decúbito dorsal horizontal demonstraram quadro obstrutivo com distensão predominantemente gasosa de alças intestinais delgadas e de parte do intestino grosso, sem sinais de pneumoperitônio. A ultrassonografia exibiu distensão gasosa sem sinais de líquido livre no momento do estudo. Com tais exames apontando para obstrução baixa sem causa definida, optou-se por realizar tomografia computadorizada (TC) do abdome para esclarecimento diagnóstico e definição de conduta terapêutica.

Pela suspeita clínica de obstrução neoplásica, a paciente foi encaminhada ao nosso serviço. Com a realização da TC estabeleceu-se o diagnóstico, e diversas técnicas de reconstrução das imagens empregadas - reconstruções multiplanares, curvas e tridimensionais (3D) - foram utilizadas para apresentar ao médico solicitante os achados de uma maneira de fácil compreensão.

A TC demonstrou amplo trajeto fistuloso comunicando a luz da vesícula biliar com a do cólon transverso e presença de cálculo residual na vesícula biliar (Figura 1A). A reconstrução curva na região do reto e do sigmoide demonstrou cálculo impactado no cólon sigmoide, obstruindo-o e causando distensão intestinal a montante por acúmulo fecal (Figura 1B). Uma reconstrução endoluminal com padrão de colonoscopia virtual mostrou o orifício fistuloso no cólon transverso (Figura 2A). A reconstrução 3D direcionada para materiais gasosos demonstrou a distensão gasosa difusa dos cólons direito, transverso e esquerdo e também o local da fístula biliocólica (Figura 2B). Após firmado o diagnóstico, a paciente foi submetida a cirurgia com êxito.


Figura 1. A: Imagem de TC no plano axial mostrando cálculo na vesícula biliar (seta) e trajeto fistuloso comunicando a vesícula biliar com o intestino grosso (asterisco). B: Imagem de TC em reconstrução curva mostrando cálculo biliar impactado no cólon sigmoide (seta) e distensão intestinal a montante (asterisco).


Figura 2. A: Reconstrução 3D endoluminal com padrão de colonoscopia virtual identificando o orifício fistuloso (asterisco) no intestino grosso. No detalhe, a imagem bidimensional de referência da posição do orifício (seta). B: Reconstrução 3D demonstrando a distensão intestinal gasosa e o orifício fistuloso (seta).



Colecistite aguda obstrutiva pode provocar aproximação das serosas do trato biliar e intestinal devido a dilatação da vesícula e/ou do ducto biliar comum. Com a repetição dos episódios inflamatórios e aderências das serosas, pode haver fistulização colecistointestinal, possibilitando a passagem dos cálculos biliares para a luz do intestino(1), além de impactação do cálculo em algum ponto no trajeto, ocasionando dor importante, irritação local grave, edema ou gangrena(2). Dentre as fístulas colecistointestinais, as colecistoduodenais representam mais de 70%, enquanto as colecistocólicas constituem 8% a 26% delas(3). Rigler et al. estabeleceram quatro critérios (presença de ar ou contraste nas vias biliares; identificação direta ou indireta do cálculo no intestino; alteração na posição de um cálculo previamente identificado; sinais radiológicos de oclusão parcial ou total da luz intestinal) que corroboram um diagnóstico de obstrução intestinal por cálculo(4). Utilizando esses critérios, constituiu-se a tríade de Rigler: sinais de distensão delgada, pneumobilia e cálculos ectópicos.

Apesar de incomum, é necessário estar atento à possibilidade de cólon biliar em quadros obstrutivos intestinais baixos de início agudo, a fim de estabelecer prontamente o diagnóstico correto e a instituição da terapêutica adequada.


REFERÊNCIAS

1. Wang JK, Foster SM, Wolff BG. Incidental gallstone. Perm J. 2009;13:50-4.

2. Costi R, Randone B, Violi V, et al. Cholecystocolonic fistula: facts and myths. A review of the 231 published cases. J Hepato Biliary Pancreat Surg. 2009;16:8-18.

3. Del Gaizo A, Raval B. Cholecystocolonic fistula. Applied Radiology. 2006;35:21-2.

4. Smyth J, Dasari BV, Hannon R. Biliary-colonic fistula. Clin Gastroenterol Hepatol. 2011;9:A26.










1. Universidade Estadual do Ceará (UECE), Fortaleza, CE, Brasil
2. Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Ernesto Lima Araujo Melo
Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde - Curso de Medicina
Avenida Paranjana, 1700, Campus do Itaperi
Fortaleza, CE, Brasil, 60740-000
E-mail: ernesto.melo@uece.br
 
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