Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 124 to 125



Síndrome de Boerhaave: diagnóstico diferencial de dor toracoabdominal

Autho(rs): Thiago Almeida Ribeiro; Laura Torres da Costa Cordoval; Edgard de Magalhães Viana Neto; Marcelo Almeida Ribeiro; Emília Guerra Pinto Coelho Motta

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Sr. Editor,

Paciente do sexo masculino, 61 anos, há dois dias com diarreia e êmese, relatando dispneia e dor abdominal e torácica inferior intensa, com irradiação para a região precordial e ombro esquerdo. Ao exame físico apresentava abdome rígido, murmúrios vesiculares reduzidos, com crepitações grosseiras em ambas as bases pulmonares. Foi realizada tomografia computadorizada (TC) de tórax, que demonstrou pneumomediastino posterior e densificação do sítio periesofágico por conteúdo heterogêneo (Figuras 1A e 1B), e de abdome complementada com pequena quantidade de contraste oral iodado, que revelou extravasamento para o mediastino posterior (Figuras 1C e 1D). O paciente apresentou novo episódio de êmese no pronto-socorro, seguido de dessaturação. Foi encaminhado ao bloco cirúrgico em caráter de urgência. Submetido a procedimento cirúrgico extenso, foi identificada perfuração esofágica no terço distal intratorácico, sendo realizadas rafia e drenagem de conteúdo gástrico. O paciente evoluiu com instabilidade hemodinâmica, sendo transferido para o centro de terapia intensiva.


Figura 1. TC do tórax, corte axial, em janela para mediastino (A) e janela pulmonar (B) mostrando pneumomediastino e coleção na região do esôfago torácico distal. TC do abdome com contraste oral, cortes axial (C) e sagital (D), identificando escape do material ingerido para o interior da coleção paraesofágica.



Síndrome de Boerhaave é a perfuração espontânea do esôfago resultante do aumento súbito da pressão intraesofágica combinado com uma pressão intratorácica negativa(1). Trata-se de um quadro raro, com incidência de 3,1/1.000.000 por ano. Entre as perfurações esofagianas, cerca de 15% são por causas espontâneas e a taxa de mortalidade ultrapassa os 40%(2,3).

A perfuração esofágica ocorre mais frequentemente no aspecto posterolateral do esôfago intratorácico(1), apesar de poder surgir nas regiões cervical e intra-abdominal. O quadro condiciona contaminação mediastinal por conteúdo gástrico, precipitando mediastinite química, com possibilidade de evolução para infecção bacteriana e necrose(4). Os pacientes, comumente, evoluem com sinais e sintomas de dor torácica acentuada e desenvolvem enfisema subcutâneo, porém, um terço dos casos evolui com sintomas atípicos ou é admitido com insuficiência respiratória e/ou choque(4,5). Os pacientes com perfurações cervicais podem apresentar dor local, disfagia e disfonia, bem como tensão à palpação do músculo esternocleidomastóideo e crepitação devida ao enfisema subcutâneo.

Os diagnósticos diferenciais devem incluir infarto do miocárdio, embolia pulmonar, dissecção de aorta, pancreatite, dentre outros quadros de dor toracoabdominal(1).

A utilização dos métodos de imagem radiografia convencional, esofagograma e TC contrastada, em especial este último, é de grande valor para a detecção imediata da doença. A TC mostra maior detalhamento na avaliação dos pulmões, mediastino, pleura e aorta, além de possuir maior sensibilidade na detecção de coleções fluidas. Os achados que corroboram a ruptura incluem edema e espessamento parietal esofágico, fluido perilesional com ou sem componente gasoso, alargamento mediastinal e fluido ou ar nos espaços pleurais e retroperitônio.

As opções terapêuticas na ruptura esofágica incluem, basicamente, a conservadora, a endoscópica e a cirúrgica(6,7). A primeira consiste na interrupção da ingestão oral de alimentos, administração de fluidos, nutrição enteral, antibioticoterapia e uso de beta-bloqueadores, além da drenagem de coleções. A terapia endoscópica com colocação de stent pode ser reservada para quadros com diagnóstico precoce, sem contaminação. Por último, a indicação do tratamento cirúrgico, que varia desde debridamento local até extensa ressecção do esôfago para reparação, depende de fatores determinantes como extensão da ruptura, doenças concomitantes e presença de contaminação ou sinais de sepse.


REFERÊNCIAS

1. de Schipper JP, Pull ter Gunne AF, Oostvogel HJM, et al. Spontaneous rupture of the oesophagus: Boerhaave''s syndrome in 2008. Literature review and treatment algorithm. Dig Surg. 2009;26:1–6.

2. Vidarsdotti H, Blondal S, Alfredsson H, et al. Oesophageal perforations in Iceland: a whole population study on incidence, aetiology and surgical outcome. Thorac Cardiovasc Surg. 2010;58:476–80.

3. Brinster CJ, Shinghal S, Lee L, et al. Evolving options in the management of esophageal perforation. Ann Thorac Surg. 2004;77:1475–83.

4. Saha A, Jarvis M, Thorpe JA, et al. Atypical presentation of Boerhaave''s syndrome as enterococcal bacterial pericardial effusion. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2007;6:130–2.

5. Michel L, Grillo HC, Malt RA. Operative and nonoperative management of esophageal perforations. Ann Surg. 1981;194:57–63.

6. Ivey TD, Simonowitz DA, Dillard DH, et al. Boerhaave syndrome. Successful conservative management in three patients with late presentation. Am J Surg. 1981;141:531–3.

7. Carrott PW Jr, Low DE. Advances in the management of esophageal perforation. Thorac Surg Clin. 2011;21:541–55.










Hospital Mater Dei – Radiologia, Belo Horizonte, MG, Brasil

Endereço para correspondência:
Dr. Thiago Almeida Ribeiro
Hospital Mater Dei – Radiologia
Rua Gonçalves Dias, 2700, Barro Preto
Belo Horizonte, MG, Brasil, 30140-093
E-mail: thiago.almeida.ribeiro@gmail.com
 
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