Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
Print 

Page(s) 268 to 278



Ganglioglioma intraventricular com disseminação liquórica

Autho(rs): Patricia Pitta de Abreu1; Bernardo Carvalho Muniz1; Nina Ventura1; Emerson Gasparetto1; Edson Marchiori2

PDF Português      

PDF English

Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Paciente de 26 anos, feminina, parda, com quadro de diminuição da acuidade visual bilateral, cefaleia e crise convulsiva tonicoclônica generalizada. Tomografia computadorizada de crânio demonstrou hidrocefalia obstrutiva e lesão expansiva ocupando o terceiro ventrículo, estendendo-se para o ventrículo lateral esquerdo. Ressonância magnética (Figura 1) ratificou a presença da lesão intraventricular, com sinal intermediário em T1 e elevado em T2, captante de contraste, além de lesão no quarto ventrículo. A paciente foi submetida a ressecção da lesão que ocupava o terceiro ventrículo. Obteve-se esvaziamento tumoral, viabilizando a desobstrução do forame de Monro e consequente resolução da hidrocefalia. Houve melhora da turvação visual bilateral, mantendo-se o déficit visual à esquerda, sem outros déficits neurológicos. O laudo histopatológico demonstrou neoplasia glial e neuronal com células ganglionares, compatível com ganglioglioma grau I OMS. Posteriormente, foi realizada punção liquórica, que demonstrou células neoplásicas. Foi realizada ressonância magnética da coluna lombar, que mostrou lesão intrarraquiana e extramedular, com sinal elevado em T2 e realce após contraste, fazendo contato com a face posterolateral da medula (Figura 2), sugerindo a possibilidade de disseminação liquórica.


Figura 1. Ressonância magnética, coronal T2 (A) e sagital pós-contraste (B) demonstrando lesão com sinal discretamente elevado em T2 e com realce heterogêneo pelo meio de contraste ocupando o ventrículo lateral esquerdo (seta), estendendose através do forame de Monro ao terceiro ventrículo (cabeça de seta em A). Na aquisição sagital nota-se lesão também no interior do quarto ventrículo (cabeça de seta em B).


Figura 2. Ressonância magnética, sagital T2 (A) e sagital T1 pós-contraste (B) mostrando lesão intradural e extramedular na coluna dorsal inferior, com sinal elevado em T2 (seta) e com intenso realce pelo contraste (cabeça de seta), compatível com implante leptomeníngeo.



Uma série de trabalhos recentes tem ressaltado a importância da ressonância magnética na avaliação do sistema nervoso central(1–3), especialmente em relação aos tumores cerebrais(4,5). Gangliogliomas são tumores raros, respondendo por 0,33–1,3% dos tumores cerebrais primários(6). Acometem principalmente crianças e adultos jovens. São considerados tumores mistos por apresentarem componentes neuronal e glial. São tumores tipicamente de baixo grau (I ou II OMS), com taxa muito baixa de malignização. A localização mais comum é o lobo temporal, tendo como principal sintoma epilepsia refratária, mas podem ser encontrados em qualquer localização do encéfalo ou mesmo em localização extraparenquimatosa, como é o caso dos gangliogliomas intraventriculares(6,7). Na ressonância magnética podem se apresentar como lesões císticas, sólido-císticas ou completamente sólidas tipicamente captantes de contraste. Entretanto, a ausência de realce não exclui o diagnóstico(8).

Gangliogliomas intraventriculares são muito raros, com poucos casos relatados na literatura. Esses tumores apresentam sintomas diferentes daqueles intraparenquimatosos e geralmente não estão associados a epilepsia. Os sintomas são relacionados a obstrução do fluxo liquórico e hidrocefalia, sendo frequentes cefaleia e alterações visuais(8). Foram relatados gangliogliomas intraventriculares com origem nos ventrículos laterais, terceiro e quarto ventrículo e, inclusive, originados no plexo coroide(6–11), devendo estar sempre incluídos no diagnóstico diferencial de lesões intraventriculares.

O caso aqui apresentado é um ganglioglioma intraventricular com origem aparentemente no terceiro ventrículo, se estendendo aos ventrículos laterais e ao quarto ventrículo, sendo o diagnóstico histopatológico de ganglioglioma grau I com sinais de disseminação liquórica nos exames subsequentes. Em conclusão, o diagnóstico de ganglioglioma deve ser considerado na presença de lesões intraventriculares. Além disso, a investigação por imagem do neuroeixo é recomendada, independente do grau histopatológico da lesão, uma vez que disseminação liquórica tem sido relatada no acompanhamento de outros tumores de baixo grau, inclusive de gangliogliomas(12,13).


REFERÊNCIAS

1. Georgeto SM, Zicarelli CAM, Gariba MA, et al. T1-weighted gradientecho imaging, with and without inversion recovery, in the identification of anatomical structures on the lateral surface of the brain. Radiol Bras. 2016;49:382–8.

2. Niemeyer B, Muniz BC, Gasparetto EL, et al. Congenital Zika syndrome and neuroimaging findings: what do we know so far? Radiol Bras. 2017;50:314–22.

3. Jugpal TS, Dixit R, Garg A, et al. Spectrum of findings on magnetic resonance imaging of the brain in patients with neurological manifestations of dengue fever. Radiol Bras. 2017;50:285–90.

4. Sharma R, Gupta P, Mahajan M, et al. Giant nontraumatic intradiploic arachnoid cyst in a young male. Radiol Bras. 2016;49:337–9.

5. Queiroz RM, Abud LG, Abud TG, et al. Burkitt-like lymphoma of the brain mimicking an intraventricular colloid cyst. Radiol Bras. 2017;50: 413–4.

6. Deling L, Nan J, Yongji T, et al. Intraventricular ganglioglioma prognosis and hydrocephalus: the largest case series and systematic literature review. Acta Neurochir (Wien). 2013;155:1253–60.

7. Hauck EF, Vu L, Campbell GA, et al. Intraventricular ganglioglioma. J Clin Neurosci. 2008;15:1291–3.

8. Samdani AF, Torre-Healy A, Khalessi A, et al. Intraventricular ganglioglioma: a short illustrated review. Acta Neurochir (Wien). 2009;151:635–40.

9. Jaeger M, Hussein S, Schuhmann MU, et al. Intraventricular trigonal ganglioglioma arising from the choroid plexus. Acta Neurochir (Wien). 2001;143:953–5.

10. Prasad GL, Kumar R, Kurwale N, et al. Intraventricular gangliogliomas: a review. World Neurosurg. 2016;87:39–44.

11. Castro FD, Reis F, Guerra JGG, et al. Intraventricular mass lesions at magnetic resonance imaging: iconographic essay – part 1. Radiol Bras. 2014;47:176–81.

12. Jay V, Squire J, Blaser S, et al. Intracranial and spinal metastases from a ganglioglioma with unusual cytogenetic abnormalities in a patient with complex partial seizures. Childs Nerv Syst. 1997;13:550–5.

13. Syed HR, Rhee JW, Jha RT, et al. Concurrent intraventricular and sacral spinal drop metastasis of ganglioglioma in an adult patient: a case report and review of literature. Cureus. 2016;8:e538.










1. Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
2. Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Patricia Pitta de Abreu
Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer
Rua do Rezende, 156, Centro
Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 20230-024
E-mail: papitta@gmail.com
 
RB RB RB
GN1© Copyright 2024 - All rights reserved to Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Av. Paulista, 37 - 7° andar - Conj. 71 - CEP 01311-902 - São Paulo - SP - Brazil - Phone: (11) 3372-4544 - Fax: (11) 3372-4554