Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 5 - Set. / Out.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 335 to 335



Paralisia facial bilateral associada a leptospirose

Autho(rs): Aston Midon; Fabiana Batista Corrêa; Raphael Doyle Maia; Aline Gasparini Sampaio; Marcos Rosa Júnior

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Sr. Editor,

Homem de 26 anos, com história de contato com roedores, foi admitido com cefaleia, mialgia, artralgia, febre alta, dor abdominal, vômitos e hepatoesplenomegalia, evoluindo com icterícia, sufusão conjuntival, edema de membros superiores e inferiores e derrame pleural. A investigação sorológica procedeu com pesquisa de anticorpos IgM para Leptospira positiva, obtendo o paciente melhora com antibioticoterapia específica. O paciente apresentou, entretanto, no 11º dia de evolução da doença, paralisia facial bilateral. Exame de ressonância magnética demonstrou impregnação linear pelo gadolínio das porções cisternal, timpânica, labiríntica e dos gânglios geniculados dos nervos faciais (Figura 1). Foi instituída terapia com prednisona, obtendo-se melhora completa do quadro.


Figura 1. Ressonância magnética, aquisição T1 após a administração do gadolínio, nos planos axial (A,B) e coronal (C) demonstrando impregnação linear dos nervos faciais no interior dos condutos auditivos internos.



A leptospirose é uma doença febril aguda, comum em países tropicais, causada pela Leptospira interrogans. Sua incidência está relacionada a condições sanitárias precárias, as quais favorecem a proliferação de roedores, os principais vetores da doença. O roedor infectado elimina as espiroquetas pela urina, que contaminam a água das chuvas, expondo a população ao agente, principalmente durante as enchentes(1).

Sintomas neurológicos podem compor o espectro clínico da doença e estão presentes em 12% a 40% dos casos. Existem poucos casos relatados de leptospirose associada a paralisia facial, e a associação com paralisia facial bilateral é ainda mais incomum(2,3).

A paralisia facial bilateral é uma entidade clínica muito rara e geralmente relacionada a doenças sistêmicas. Diferentemente da paralisia facial unilateral, a bilateral tem causa idiopática em apenas 20% dos casos(4). O diagnóstico diferencial é amplo e tem como principais causas a doença de Lyme (36%), a síndrome de Guillain-Barré (5%), o trauma (4%), a sarcoidose (0,9%) e a AIDS (0,9%)(4-7).

O diagnóstico depende da história do paciente, que guiará a investigação posterior. A prioridade na investigação desses pacientes é primeiramente diagnosticar as situações ameaçadoras à vida, como leucemia e síndrome de Guillain-Barré. Deve-se proceder a um exame físico completo, além de testes laboratoriais como hemograma, testes treponêmicos, HIV, glicemia, velocidade de hemossedimentação, anticorpos antinucleares, sorologia para doença de Lyme, punção lombar, além do estudo por ressonância magnética do encéfalo para pesquisa de outros nervos cranianos envolvidos ou outros achados associados(7). Em nosso meio, como a leptospirose é uma entidade comum nas épocas de enchentes, caso o paciente evolua com paralisia facial bilateral, devemos também pensar nessa condição como causa e assim incluir os testes específicos para diagnóstico desta afecção(1).

No caso aqui relatado, houve instalação da paralisia facial bilateral no curso de febre ictero-hemorrágica e, mais especificamente, no 11º dia da instituição da doença, o que é compatível com os outros relatos da literatura, nos quais a paralisia facial surgiu na fase imune da doença. A patogênese dessa condição ainda não é bem conhecida, mas acredita-se que a Leptospira possa causar uma vasculite sistêmica e ativar a formação de imunocomplexos(1). Entretanto, ainda não foi consolidada uma relação causal específica entre a leptospirose e a paralisia facial, logo, a descrição de novos casos é fundamental para que se conheça melhor a relação entre as duas entidades e o interesse por novos estudos sobre o tema seja fomentado.


REFERÊNCIAS

1. Silva AA, Ducroquet M, Pedrozo Junior JC. Bilateral facial palsy associated with leptospirosis. Braz J Infect Dis. 2009;13:319-21.

2. Costa E, Sacramento E, Lopes AA, et al. Facial nerve palsy associated with leptospirosis. Rev Soc Bras Med Trop. 2001;34:219-20.

3. El Bouazzaoui A, Houari N, Arika A, et al. Facial palsy associated with leptospirosis. Eur Ann Otorhinolaryngol Head Neck Dis. 2011;128:275-7.

4. Jain V, Deshmukh A, Gollomp S. Bilateral facial paralysis: case presentation and discussion of differential diagnosis. J Gen Intern Med. 2006;21:C7-10.

5. Price T, Fife DG. Bilateral simultaneous facial nerve palsy. J Laryngol Otol. 2002;116:46-8.

6. Machado VS, Silva Junior NA, Queiroz LS, et al. Central nervous system involvement in sarcoidosis. Radiol Bras. 2015;48:334-5.

7. Teller DC, Murphy TP. Bilateral facial paralysis: a case presentation and literature review. J Otolaryngol. 1992;21:44-7.










Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, ES, Brasil


Correspondência:
Dr. Marcos Rosa Junior
UFES - Setor de Neurorradiologia, Centro de Ciências da Saúde
Avenida Marechal Campos, 1355, Maruípe
Vitória, ES, Brasil, 29043-900
E-mail: marcosrosajr@hotmail.com
 
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