Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 37 nº 3 - Maio / Jun.  of 2004

QUAL É O SEU DIAGNÓSTICO?
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Qual o seu diagnóstico?

Autho(rs): Públio Cesar Cavalcante Viana, Marco da Cunha Pinho, Alípio Ormond Filho, Rodrigo Caruso Chate, Marcos Roberto de Menezes

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Com a recorrência do quadro doloroso, procurou o pronto-socorro do HC-FMUSP, sendo feita a hipótese de abdome agudo inflamatório localizado na fossa ilíaca direita. Os exames laboratoriais foram normais.

Realizou então exame de ultra-sonografia (US), que mostrou hiperecogenicidade e borramento dos planos gordurosos na fossa ilíaca direita, sugerindo processo inflamatório local, sem visualização do apêndice cecal. Dada a forte suspeita diagnóstica, prosseguiu-se a investigação com a realização de tomografia computadorizada (TC) abdominal (Figuras 1 a 6).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Achados de imagem

À TC do abdome foi evidenciada massa heterogênea com atenuação de gordura, associada a densificação dos planos adiposos do flanco e fossa ilíaca direita, lateralmente ao cólon ascendente, compatível com o grande omento. Notar que a densificação é restrita a essa região e que o apêndice cecal e o ceco estão normais. Não há evidências de líquido livre ou coleção intraperitoneal.

Diagnóstico: Infarto segmentar do grande omento.

 

 

COMENTÁRIOS

O diagnóstico sindrômico de abdome agudo inflamatório localizado na fossa ilíaca direita abrange, como principais diagnósticos diferenciais, apendicite, diverticulite e colecistite agudas, ileíte terminal, apendagite e infarto segmentar do omento(1).

A torção omental com infarto é urgência abdominal rara que acomete pacientes de meia-idade, com predomínio do sexo masculino (3:2). Mais comumente ocorre sem causa evidente (infarto segmentar idiopático ou primário), não havendo ponto de fixação demonstrável. Fatores considerados predisponentes para este tipo de torção incluem a obesidade e a presença de omento redundante e exageradamente móvel. A maior parte dos infartos acomete a porção direita do omento, provavelmente devido às maiores dimensões, peso e mobilidade deste segmento. Nos casos de torções ditas secundárias, cirurgias prévias, tumores, aderências e hérnias encarceradas são comumente implicados.

Em pacientes pediátricos a obesidade tem sido ressaltada como importante fator predisponente, provavelmente devido às proporções epidêmicas que esta tem tomado em crianças de países desenvolvidos, como é o caso, por exemplo, dos EUA. Estudos comparativos entre crianças do sexo masculino e feminino com índices de massa corpórea semelhantes têm mostrado maior incidência de torção em meninos(2?6), o que parece ser explicado pela maior tendência destes em apresentar acúmulo central de gordura (distribuição fisiológica dependente do sexo), com omentos mais espessos e pesados.

O diagnóstico de infarto omental é feito na maior parte das vezes durante o ato cirúrgico, pois a expressão clínica dos processos inflamatórios da fossa ilíaca direita tem como primeira hipótese a apendicite aguda, sendo freqüentemente indicada cirurgia sem a realização de exames complementares.

As modalidades de diagnóstico por imagem, seja a US ou a TC, podem com muita propriedade avaliar as afecções que acometem a fossa ilíaca direita, principalmente quando se trata de processos inflamatórios. Nos casos de infarto de omento, estes métodos irão mostrar a densificação de planos gordurosos com formação de massa, sem sinais de acometimento dos órgãos desta região(7?9). A massa consiste de necrose gordurosa, hemorragia e infiltração inflamatória. Recentemente, foi sugerido que a presença de estruturas lineares serpiginosas associadas a massa gordurosa representam vasos omentais torcidos sobre si próprios, o que corrobora o diagnóstico de infarto omental(10). Nos casos em que estejam presentes, processos concomitantes ou mesmo desencadeantes (torção secundária) podem ser demonstrados(11).

As modalidades de tratamento mais aceitas são a conduta expectante com medicações sintomáticas e a omentectomia, que pode ser feita por via laparoscópica. Os argumentos em defesa da omentectomia em vez do tratamento conservador são a melhora imediata dos sinais clínicos e a aparente menor taxa de possíveis complicações (formação de abscesso, obstrução intestinal por adesões).

Atualmente, os avanços tecnológicos dos métodos de imagem possibilitaram um crescimento na utilização destes para a avaliação das enfermidades que acometem o abdome, em especial nos casos agudos, e principalmente quando estamos falando das afecções do apêndice cecal e seus respectivos diagnósticos diferenciais. Num cenário de inespecificidade de dados clínicos e laboratoriais, como são em geral os casos de torção omental, os métodos de diagnóstico por imagem assumem papel de destaque, pois podem, além de indicar o diagnóstico, evitar procedimentos cirúrgicos desnecessários e de alto custo.

 

REFERÊNCIAS

1. Houben CH, Powis M, Wright VM. Segmental infarction of the omentum: a difficult diagnosis. Eur J Pediatr Surg 2003;13:57?9.

2. Nagar H, Kessler A, Ben-Sira L, Klepikov I, Wiess J, Graif M. Omental infarction: an unusual cause of acute abdomen in children. Pediatr Surg Int 2003;19:677?9.

3. Grattan-Smith JD, Blews DE, Brand T. Omental infarction in pediatric patients: sonographic and CT findings AJR 2002;178:1537?9.

4. Varjavandi V, Lessin M, Kooros K, Fusunyan R, McCauley R, Gilchrist B. Omental infarction: risk factors in children. J Pediatr Surg 2003;38:233?5.

5. Cervellione RM, Camoglio FS, Bianchi S, et al. Secondary omental torsion in children: report of two cases and review of the literature. Pediatr Surg Int 2002;18:184?6.

6. Schlesinger AE, Dorfman SR, Braverman RM. Sonographic appearance of omental infarction in children. Pediatr Radiol 1999;29:598?601.

7. McClure MJ, Khalili K, Sarrazin J, Hanbidge A. Radiological features of epiploic appendagitis and segmental omental infarction. Clin Radiol 2001; 56:819?27.

8. Puylaert JBCM. Right-sided segmental infarction of the omentum: clinical, US and CT findings. Radiology 1992;185:169?72.

9. van Breda Vriesman AC, Puylaert JB. Epiploic appendagitis and omental infarction: pitfalls and look-alikes. Abdom Imaging 2002;27:20?8.

10. Pilleul F, Bonifacio A, Atri M. CT appearance of primary omental torsion: description of a new finding. The Journal of Radiology August 2003. www. jradiology.org

11. Schwartzman GJ, Jacobs JE, Birnbaum BA. Omental infarction as a delayed complication of abdominal surgery. Clin Imaging 2001;25:341?3.

 

 

Endereço para correspondência
Dr. Públio César Cavalcante Viana
Rua Doutor Ovídio Pires de Campos, 171, ap. 403
Cerqueira César. São Paulo, SP, 05403-010
E-mail: publioviana@globo.com

 

 

* Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), São Paulo, SP.


 
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