Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 34 nº 2 - Mar. / Abr.  of 2001

EDITORIAL
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Radiologia de emergência: perspectivas

Autho(rs): Antonio Furtado Cavalcanti, Marcos Roberto de Menezes

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Sabe-se que o paciente é mais bem atendido quando o diagnóstico e a intervenção terapêutica são realizados pelo profissional mais bem treinado e prontamente disponível. A presença do radiologista retira do médico emergencista, que freqüentemente não está adequadamente treinado para tal, a sobrecarga da realização e interpretação dos exames de imagem, que consomem tempo, permitindo, desta maneira, que este tempo seja gasto diretamente na assistência e no tratamento dos pacientes.

Para a atuação na emergência, o radiologista deve ter formação generalista e treinamento nos diferentes métodos de imagem – RX, US, TC e RM.

Desde o início do serviço de radiologia de emergência instalado dentro do Pronto-Socorro do Hospital das Clínicas da FMUSP, em outubro de 1998, houve uma mudança no atendimento de muitos pacientes em muitas das especialidades. Como exemplo da atuação do radiologista na emergência, temos o papel do US na avaliação inicial de pacientes com trauma abdominal fechado, rápida e passível de ser realizada mesmo em pacientes hemodinamicamente instáveis. O exame é realizado na sala de exames, ao mesmo tempo em que são realizados todos os procedimentos necessários para o tratamento adequado naquelas situações. O US é realizado em poucos minutos, com o objetivo de identificar a presença de líquido livre na cavidade peritoneal e eventualmente a sua origem. Antigamente, a presença de sangue na cavidade peritoneal era avaliada pela lavagem peritoneal diagnóstica (LPD), que, além de ser um método invasivo, prejudicaria eventual controle ultra-sonográfico posterior. Nos pacientes estáveis, muitas vezes é realizada posteriormente à TC. Desde que começamos, houve drástica redução do número de LPDs, que foram substituídas pelo US, sendo hoje realizadas muito raramente. Nosso serviço conta com equipamentos de RX, US e TC exclusivos, e com equipe de radiologistas.

O US se tornou método amplamente utilizado na emergência, sendo fundamental na avaliação das urgências em ginecologia e obstetrícia, na vascular, que envolve o estudo com Doppler colorido nos casos de tromboses venosas, oclusões arteriais e lesões vasculares traumáticas, e no exame do abdome agudo, em que complementa o estudo realizado com radiografias convencionais(3). Algumas vezes, nas quais o diagnóstico não foi estabelecido, é realizado o exame tomográfico computadorizado.

Outra aplicação do US e da TC é na orientação de procedimentos intervencionistas – como drenagens de coleções intraperitoneais, derrames pericárdico e pleural – , bem como de biópsias, quando esses procedimentos forem necessários e oportunos.

A TC é essencial, principalmente no que concerne às urgências neurológicas. Não se concebe um serviço de emergência neurocirúrgica e neuroclínica sem a disponibilidade de um tomógrafo. A TC desempenha papel importante na avaliação de pacientes com cefaléias importantes, convulsões e importantes déficits neurológicos, e de politraumatizados que se apresentam estáveis hemodinamicamente e com presença de líquido livre na cavidade intraperitoneal ao US. Muitas decisões terapêuticas são baseadas nos achados tomográficos. A classificação e o monitoramento por TC dos traumas hepáticos e esplênicos têm reduzido significativamente a indicação de tratamento cirúrgico nesses pacientes(4). Os novos equipamentos com tecnologia espiral e "multi-slice" permitem exames mais rápidos e a realização de estudos angiográficos por TC, substituindo, em muitas situações, a angiografia convencional, como na avaliação do trauma torácico com alargamento de mediastino ao RX, em que se suspeita de lesão da aorta. A prevalência de lesão da aorta utilizando apenas esse critério é de apenas 5%, como mostra a literatura cirúrgica; como conseqüência, realizava-se um número grande e desnecessário de aortografias. A tomografia espiral tem sensibilidade e especificidade semelhantes à arteriografia na avaliação da lesão traumática da aorta(5-7). A arteriografia pulmonar foi substituída pela arteriografia por TC espiral com contraste introduzido por meio de bomba injetora nos casos de suspeita de tromboembolismo pulmonar.

Muitos prevêem que num futuro não-distante a TC espiral sem contraste será o método por imagem de escolha na avaliação inicial do paciente na emergência(8).

Nossos dois anos e meio de experiência mostraram que a radiologia na emergência é um "mundo" à parte, se assim podemos chamar esta especialidade extremamente envolvente e cativante, na qual a rotina é nos depararmos com situações freqüentemente inusitadas e desafiadoras do ponto de vista diagnóstico e emocional. No contato com o paciente grave, seja vítima de politrauma, acidente isquêmico cerebral ou apresentando abdome agudo, nos envolvemos com a pessoa e seus familiares e não simplesmente com o diagnóstico numa distante sala de laudos, acompanhando a evolução favorável ou não desses casos.

Antes da inauguração do serviço, o acesso dos pacientes de pronto-socorro aos métodos de imagem era mais difícil porque eram "encaixados" no meio de uma pesada rotina de exames dos pacientes internados e ambulatoriais, havendo demora injustificável no atendimento dos pacientes mais urgentes. Durante a noite, os casos eram atendidos pelos residentes que davam plantão a distância. Como não havia disponibilidade de exames e de radiologistas, os casos eram muitas vezes resolvidos apenas pela avaliação clínica/cirúrgica/laboratorial dos médicos que, ao longo dos anos, foram adquirindo experiência no tratamento desses pacientes.

A presença do radiologista no pronto-socorro veio acrescentar a força dos métodos de imagem no diagnóstico, possibilitando tratamentos eficientes. Notamos, reciprocamente, a necessidade de uma forte integração com as diferentes especialidades que atuam no pronto-atendimento, com um fluxo rápido e preciso de informações entre as partes e com a participação ativa do radiologista nas decisões que determinam a conduta terapêutica. Como o serviço é novo, estamos todos em um curva de aprendizado e a convivência tem sido benéfica para todos, pois estamos aprendendo uns com os outros. Apesar da alta rotatividade das pessoas que trabalham no pronto-socorro (no fim de cada mês e no fim de cada ano são muitos os que entram e muitos os que saem), todos já sabem que a Radiologia está ali e veio para ficar.

 

REFERÊNCIAS

1. Mann FA, Zucker MI, Mower WR. Emergency radiology practice and research beyond the millenium. The American Society of Emergency Radiology. Radiology 1998;208:565–7.

2. Baker SR. Emergency radiology: challenges and issues. RadioGraphics 1996;16:935–8.

3. Gooding GAW. Emergency US: imaging initiatives and managerial challenges. RadioGraphics 1996;16:949–52.

4. Federle MP, Brant-Zawadzki M. Computed tomography in the evaluation of trauma. 2nd ed. Baltimore, MD: Williams & Wilkins, 1986.

5. Gavant ML, Flick P, Menke P, Gold RE. CT aortography of thoracic aortic rupture. AJR 1996;166:955–61.

6. Mirvis SE, Shanmuganathan K, Miller BH, White CS, Turney SZ. Traumatic aortic injury: diagnosis with contrast-enhanced thoracic CT – five-year experience at a major trauma center. Radiology 1996;200:413–22.

7. Dyer DS, Moore EE, Mestek MF, et al. Can chest CT be used to exclude aortic injury? Radiology 1999;213:195–202.

8. Harris JH. Reflections: emergency radiology. Radiology 2001;218:309–16.


 
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